terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Massinha



Houve um tempo em que o tempo que importava era o tempo que ainda não me pertencia. O tempo sonhado, imaginado, desejado, previsto. Futuro. O passado era uma sacola vazia.

Houve um tempo, nesse tempo, no qual eu escreveria. De mim. Falaria do tempo ainda por vir, de tudo que faria sem saber como, de tudo que seria pela simples vontade de ser. Um tempo no qual o tempo não contava, era massinha de modelar vontades. Massinha colorida, na qual a marca dos dedos, digitais, me lembrariam sempre que aquele molde era somente meu. De um futuro todo meu.

Depois, o tempo se encarregou de fazer-se tempo. E o tempo lá de trás, das massinhas frescas, dos sonhos embebecidos de si mesmos, foi se tornando somente isso: lá de trás. Aí, os finais de ano, como agora, de fazer agenda e novos planos, viraram sobretudo época de balanço. Época de, antes de apontar o olhar pra frente, girar-se pra entender o que se fez. Entender o tempo corrido, histórico, passado, que virou a massinha dura, seca, irrecuperavelmente imodelável.

Brincar de massinha era brincar com vidas possíveis. Era ser flexível, consigo e com o tempo.

Estou cheio de bonequinhos, casinhas, carrinhos, bichinhos e flores. De massinha seca. Estão por todo lugar na minha vida e coleciono pra lembrar que um dia brinquei de modelar.

Este ano, no fim, quero apenas jogar todos fora. Uma lixeira, lotada, pra arremessar fora de mim. Esvaziar-me de sonhos secos, vontades endurecidas e esboços estáticos de um futuro que não passou de desejo. É hora de remodelar.