terça-feira, 12 de julho de 2022

Palavras de combate

Há anos não escrevo aqui. Para viver, Parei de escrever (pelo menos foi o que pensei). Melhor mesmo se eu tivesse continuado escrevendo... As palavras escritas aqui ou num diario, numa ultima pagina de um caderno velho ou num guardanapo qualquer... são diferentes quando escritas na pele. E para tantas ocasiões, palavras não foram ou seriam suficientes para descrever o que vivi ou senti. Em geral, calou-me muito a morte. A morte dos meus, a morte de sonhos, a perda daquilo que não se deveria perder, entre eles o amor por si mesmo. Sim, antes eu tivesse escrito mais, pois escrever era um ato de amor por aquele garoto que fui um dia e que escrevia tão bem. Aquele garoto que existiu pelo meu desejo de que ele existisse e, sobretudo, resistisse. Aquele garoto tão necessário que criei para não me lembrar do indizível. Pois o menino que encontrou palavras pra dizer tanta coisa, não soube dizer pra si mesmo, por décadas, sobre um abuso que sofreu na infância. Em mim, criou-se aquele menino que escrevia coisas extraordinariamente profundas para a pouca idade que tinha. Fazia sentido: os sentimentos estavam ali, as lembranças claramente não. E eu que cheguei a pensar que aquele menino fosse tão frágil. Ele tava combatendo sozinho uma guerra, o menino.

segunda-feira, 11 de julho de 2022

Alegria do divã

Não sei mais o que sou.

No olhar de criança, o problema senil
Na ruga profana, o sentimento infantil
Do entusiasta que canto, o pessimista calado
Por trás do senso do justo, o ódio embutido
Da crença divina, o mundo chorado

Palavra ou vírgula
samba ou marcha fúnebre
perfume ou mau odor
Não sou nem fruto maduro pra apodrecer?

Se não sei bem o que sou, então sou a própria dúvida
Sou a alegria do divã, a criança que em pesadelo chora pela manhã

Se não sei o que sou, talvez seja a vontade de ser
Talvez nem concreto, perfídio desejo de viver

Um rio que só corre, sem saber
Rio que não chegou ao mar
De tudo o incompleto
Canção de quem um dia vai cantar

Talvez o futuro
Talvez creia em mim
Talvez quem sabe logo
Um talvez que terá fim.

 (Ainda do caderno velho, ainda com 15. Como era bom rimar e sonhar que encontraria a resposta)